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Progredir. Com ou sem Dona Aparecida.

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O ano de 2009 marca o início de outra caminhada para Meire; era preciso dar vazão aos planos e correr atrás do seu próximo capítulo. Formada, começa a frequentar um pré-vestibular com o intuito de se preparar melhor para o que viria. Mesmo encaminhada, teve outro esbarrão. O programa Sem Limite cobria apenas transporte educativo dentro do município de Contagem, enquanto Meire via em Belo Horizonte as melhores oportunidades. A restrição do programa causou alarde. Meire travou momento difícil em sua trajetória quando, em conflito com o regulamento do projeto, teve o benefício suspenso. Diante do stress e da insegurança, Meire via em risco a sua intenção de ingressar num curso de ensino superior. Foram idas e vindas à prefeitura de Contagem, reuniões, apelos e movimentação legal para que conseguisse reestabelecer seu benefício. Nesse meio tempo, Meire consegue uma bolsa integral de estudos para o sonhado curso superior, mas ainda se encontrava restringida pelo regulamento do programa que a levaria á faculdade. Após algumas semanas de embate, recuperou o que lhe era de direito. Era hora de correr atrás do tempo perdido.

 

A opção pelo curso de Direito surgiu da vontade de “querer algo que desse prazer, abraçasse a limitação e proporciona-se a aplicações das leis para todos, em especial em prol das pessoas com as mesmas dificuldades” enfrentadas por ela. Ouviu opiniões divergentes. Ignorou todas. No segundo semestre de 2010 já estava matriculada na Newton Paiva. A faculdade a recebia como única cadeirante de um prédio de nove andares, muitas escadas e quase nenhuma adaptabilidade a pessoas com deficiência. Mais uma missão para Meire. Ao longo dos meses, trabalhou com órgãos internos da instituição na busca de melhores opções de acessibilidade, chegando a reivindicar longa lista oficial de mudanças que eram necessárias, não só para ela, mas para qualquer outro deficiente que viesse a frequentar o local. E conseguiu. Bebedouros foram adaptados, assim como banheiros e marcos de portas sofreram alterações. O legado não ficou só para ela.

 

Pelos corredores da faculdade, Meire não passa despercebida. É cumprimentada, recebe mimos, mas segundo a própria, a timidez ainda a impede de interagir mais. “Talvez eu tenha que trabalhar mais esse aspecto. Por ainda ser um tanto dependente da minha mãe aqui na faculdade, preciso me virar um pouco mais sozinha. Preciso me comunicar mais.”. De fato. Ao seu lado, Dona Aparecida acompanha a filha fielmente todas as noites de casa até a porta da sala de aula. Pega a van e tudo. Enquanto Meire estuda, a mãe fica do lado de fora, sentada em uma carteira já praticamente sua ou proseando com os vários amigos que fez ao longo de três anos. “Se pudesse, estudaria também. Aqui eu me sinto em paz. Não é sacrifício meu ajudar minha filha a fazer o que mais gosta.”

 

Os braços magros de Aparecida não condizem com a força que ela carrega sua missão. Dona de semblante simples, estar ao seu lado provoca a sensação de se ensopar em uma tempestade sem guarda-chuvas, onde cada gota d´água nada mais é que uma mistura de afabilidade e mansidão. Sua prosa é dócil, mas esclarecida. Conta que Meire sofreu na infância com o fato da sua deficiência, mas nunca chegou a ser rebelde. Deu trabalho apenas em momentos esporádicos, com pequenas aventuras entre primos e vizinhos, nada de anormal para uma criança alegre como foi. Mas a alegria dava lugar ao choro toda vez em que Meire, ainda em fase de diagnósticos e muitas visitas a hospitais, realizava constantes exames para um aprofundamento maior sobre sua condição. Dona Aparecida recorda, com os olhos marejados, as inúmeras vezes em que ainda bebê, Meire passava por incômodas horas de exames, radiografias e sessões de fisioterapia. “Após o diagnóstico dela, com um ano de idade, continuamos o tratamento no Hospital da Baleia. Mas era muita coisa que ela passava. Era bebê ainda e já tinha que esticar em maca, tirar raio-X, alongar. Um desses exames eu não pude entrar na sala e só escutava o choro dela, alto, lá do corredor do Hospital. Partia meu coração.”. Repleta de inocência e ainda sem noção completa de sua situação física, Meire desejava outra realidade. “Lá pelos três anos de idade ela vivia dizendo que queria ser bailarina! Via as outras crianças no hospital e pedia para andar igual a elas. Como mãe eu seguia firme e prometia algo que, no fundo, eu não poderia cumprir”

 

Meire ainda seria submetida a duas cirurgias corretivas após completar 11 anos. Seu grau de escoliose – encurvamento anormal da coluna vertebral, que provoca dor lombar e nas costas – atingira um grau alarmante e era preciso amenizar o quadro. Durante a segunda cirurgia, no afastamento das costelas, teve um pulmão perfurado pelo osso, o que a mandou direto para o CTI. A situação financeira era apenas uma das complicações, já que Meire teve que permanecer internada e correu sérios riscos de saúde. A recuperação foi lenta, mas, por fim, pode voltar para casa a tempo de receber a irmã Daniely, que nasceria em 1996.

 

Perguntada como enxerga a personalidade da filha, Dona Aparecida é enfática, mas à sua maneira afável. “Quando ela quer alguma coisa, tem que ser e pronto. É uma menina de personalidade e opinião forte, que defende as coisas que acredita, mas que às vezes tem dificuldades de aceitar a opinião dos outros. Mas acho que o tempo vem ajudando ela a mudar essa questão.” E parece que vem mesmo. Se a personalidade forte e resignada lhe conduziu até uma sala de aula, mesmo diante de tantas dificuldades, parar aqui não seria a melhor opção. Era preciso caminhar um pouco mais ao norte e Meire vem mostrando como isso é possível.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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